A primeira dose foi administrada sob supervisão médica. Em apenas dez minutos, o ruído constante — um padrão de estereotipia vocal que tomava quase todo o dia — cessou. “Ele ficou em silêncio, olhou para mim, e eu soube que alguma coisa tinha mudado”, conta Nathalia Godoy, mãe que iniciou o tratamento com Cannabis medicinal quando o filho tinha quase dois anos. Hoje, cinco anos depois, aos sete anos de idade, o tratamento segue fazendo parte da rotina da criança.
Ela não fala em cura. Mas afirma, com clareza, que aquele momento marcou o início de uma nova etapa: mais regulada, mais funcional e, sobretudo, com mais possibilidade
Diagnóstico e intuição materna
Aos 8 meses, os sinais começaram a surgir: ausência de contato visual, falta de resposta ao nome, pouco interesse pelo entorno.
“Eu já sabia que tinha alguma coisa diferente, acompanhava a escala de desenvolvimento e alguns marcos não eram alcançados. Porém, muitas vezes, não era ouvida, recebia respostas dizendo que não tinha nada”, conta. Após insistir e buscar ajuda especializada, o diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista (TEA) veio cerca de um ano depois.
“Procuramos um pediatra, que fez alguns testes, e depois uma psiquiatra especialista em autismo. Foi todo um processo particular, porque o SUS não tem protocolos adequados e o acesso é muito difícil e demorado”, conta a mãe.
Nathalia também investiu em formação nas principais terapias comportamentais para entender melhor o filho e oferecer o melhor apoio possível. “Fiz cursos em ABA, Denver e terapia naturalista para conseguir ajudar minha criança.”
Estereotipias, autolesões e a busca por uma alternativa farmacológica

Nathalia Godoy
Entre 1 e 2 anos de idade, a criança apresentava quadros frequentes de desregulação. “Ele batia a cabeça na parede. A ruminação vocal era contínua. Era difícil viver, para ele e para nós.” Nesse momento, a família descartou o uso de medicamentos convencionais e procurou orientação para iniciar o tratamento com Canabidiol (CBD).
“Quando vimos que uma intervenção medicamentosa era necessária, não tivemos dúvidas: nossa primeira escolha foi o tratamento com Cannabis”, explica Nathalia.
A decisão de iniciar o tratamento não foi casual. “Hoje que a gente tem conhecimento, sabe o que o Sistema Endocanabinoide realiza no organismo, é factual o porquê dessa terapia ser ancestral e milenar” diz. Para a família, “a Cannabis foi a primeira opção” — uma escolha feita com conhecimento e esperança.
A resposta inicial surpreendeu: “Dez minutos depois da primeira dose, ele estava calmo. Parou de vocalizar, se mostrou presente. Foi muito rápido.”
Rotina terapêutica: Cannabis como parte de um modelo integrado
O tratamento é supervisionado por profissionais especializados e não é realizado de forma autônoma. “A Cannabis não vem para substituir, mas para complementar o trabalho dos terapeutas”, explica Nathalia. Ela ressalta que a terapia com Cannabis faz parte de um modelo integrado, onde a interação com outros tratamentos e o acompanhamento clínico contínuo são fundamentais para garantir resultados eficazes e responsáveis.
Ao longo dos anos, os ganhos foram múltiplos: melhora no sono, redução das crises sensoriais, aumento da atenção conjunta e da comunicação funcional. “Hoje ele não é verbal no sentido tradicional, mas tem intenção comunicativa, responde a comandos, aponta, nomeia familiares.”
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Uma transformação que vai além do cuidado
A experiência de tratar o filho com Cannabis medicinal levou Nathalia a se aprofundar no tema, dialogar com outras famílias e fundar iniciativas de acolhimento. “A Cannabis me deu propósito. Me tirou do lugar de dor e me colocou em movimento”, conta.
A experiência despertou nela um engajamento contínuo em torno do tema — não apenas como mãe, mas também como integrante de uma comunidade empenhada em garantir o acesso ao cuidado. A vivência a transformou também como cidadã.
“Mamãe”: a palavra que custou anos para chegar
Entre os momentos mais marcantes da evolução do filho, Nathalia cita o dia em que ele disse “mamãe”. “É uma palavra simples, mas foi a confirmação de que ele entendeu a troca, a comunicação, o vínculo.”
Hoje, o menino frequenta escola com apoio terapêutico e segue em acompanhamento clínico. A mãe reconhece que não há resposta única para todas as famílias, mas acredita que relatos reais ajudam a ampliar horizontes.
“Não estou dizendo que Cannabis é para todos. Mas o que posso afirmar é que, na nossa história, ela trouxe dignidade. E isso muda tudo.”
Nota da Redação
Este conteúdo não divulga o nome da criança em respeito às diretrizes de proteção à identidade de menores