Um estudo liderado pela psiquiatra Kirsten Müller-Vahl, da Hannover Medical School (Alemanha), se destacou ao avaliar pela primeira vez o uso de medicamentos à base de Cannabis para tratar a síndrome de Tourette infantil a longo prazo.
A pesquisadora, referência internacional no tema, acompanhou dois meninos por mais de cinco anos sob tratamento contínuo com canabinoides. Os resultados mostraram redução expressiva dos tiques, melhora na qualidade de vida e ausência de prejuízos cognitivos.
Esses achados indicaram que, sob supervisão médica e com formulações controladas, o uso medicinal da Cannabis pode ser uma alternativa segura e eficaz para crianças e adolescentes com Tourette resistente a outros tratamentos.
Tourette infantil: quando os tiques afetam a infância
A principal característica da síndrome de Tourette são os tiques motores e vocais involuntários. São movimentos ou sons repentinos que a pessoa não consegue controlar.
Geralmente, esses sintomas surgem ainda na infância e, em casos mais graves, prejudicam o convívio social, a autoestima e o aprendizado. Também é comum que a síndrome venha acompanhada de ansiedade, depressão, isolamento social e transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH).
O tratamento costuma envolver equipe multidisciplinar, combinando terapia comportamental e medicamentos antipsicóticos, mas nem sempre há resposta satisfatória. Por isso, o uso dos compostos da Cannabis vem despertando interesse crescente entre cientistas, especialmente por sua capacidade de aliviar sintomas e melhorar o bem-estar dos pacientes.

Caso 1: melhora duradoura e desempenho escolar preservado
O primeiro paciente iniciou o tratamento aos 8 anos, após tentar diversos medicamentos e psicoterapia sem sucesso. Seus tiques e TDAH afetavam tanto a rotina que ele se recusava a ir à escola.
O tratamento começou com extrato à base de tetrahidrocanabinol (THC) isolado, em doses entre 8 e 29 mg por dia. Após melhora, os médicos substituíram por uma formulação rica em THC e pequenas quantidades de canabidiol (CBD), na proporção 25:0,5. A dose foi ajustada para 12,5 a 15 mg de THC diários.
Durante seis anos de acompanhamento, os resultados se mantiveram: tiques controlados, humor equilibrado e o retorno às atividades escolares. Os boletins mostravam notas entre “bom” e “muito bom”, e os testes cognitivos apontaram velocidade de processamento acima da média e memória de trabalho dentro do esperado.
Nenhum efeito colateral grave foi registrado, apenas leve sonolência no início do tratamento.
Caso 2: controle dos tiques e estabilidade cognitiva
O segundo paciente iniciou o tratamento aos 12 anos, com supervisão dos pais, ambos médicos. Ele recebia doses diárias de 48 a 114 mg de THC, ajustadas conforme a intensidade dos tiques.
Durante os cinco anos, o garoto apresentou redução consistente dos tiques, melhora do sono e maior tranquilidade emocional. Sua qualidade de vida aumentou significativamente e as notas escolares permaneceram estáveis.
Os testes cognitivos mostraram resultados dentro da média, sem indícios de perda de memória, atenção ou motivação. O único diagnóstico adicional foi um transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) leve a moderado, considerado parte da evolução natural da síndrome de Tourette.
Nenhum sinal de dependência, uso recreativo ou sintomas psiquiátricos adversos foram observados.
Como a Cannabis atua na síndrome de Tourette infantil
De acordo com o estudo, os benefícios observados estariam relacionados à ação dos canabinoides no sistema endocanabinoide. Pesquisas anteriores sugerem que as pessoas com Tourette podem ter um desequilíbrio nesse sistema e na liberação de dopamina (neurotransmissor envolvido na coordenação motora).
O THC atua nos receptores do sistema endocanabinoide no cérebro, ajudando a restabelecer o equilíbrio químico e reduzindo tiques e sintomas comportamentais. Além disso, pequenas quantidades de CBD podem atenuar possíveis efeitos colaterais do THC e potencializar os benefícios terapêuticos.

O uso pediátrico da Cannabis
O trabalho dos pesquisadores alemães é pioneiro ao avaliar o uso de medicamentos à base de Cannabis na síndrome de Tourette infantil em longo prazo. Até então, a maioria dos estudos haviam sido feitos com adultos ou por períodos curtos.
Embora os autores ressaltem que se trata de apenas dois casos clínicos, os achados ajudam a preencher uma importante lacuna: a falta de dados sobre segurança e eficácia em populações pediátricas. No estudo, os autores destacaram que, mesmo com altas doses de THC, não houve prejuízo cognitivo nos pacientes.
“Os resultados dos testes neurocognitivos durante o curso da terapia não mostraram evidências de que as habilidades cognitivas dos pacientes tenham ficado abaixo da média. Também não houve indicação de anormalidades comportamentais, problemas sociais, negligência de interesses sociais ou perda de interesse, motivação e iniciativa.
Isso é notável, visto que em ambos os pacientes o tratamento com canabinoides foi iniciado antes da puberdade e as doses de THC foram relativamente altas.”
Segurança e cuidados no tratamento infantil com canabinoides
O uso de medicamentos à base de Cannabis em crianças e adolescentes ainda é um tema sensível, cercado de preocupações sobre possíveis impactos no desenvolvimento cerebral, risco de dependência e efeitos sobre a memória e aprendizado.
No entanto, os pesquisadores afirmam que o uso supervisionado de canabinoides segue protocolos rigorosos para reduzir riscos:
- Formulações com composição controlada e padronizada
- Ajuste individual de doses, conforme a resposta clínica
- Acompanhamento médico constante para evitar uso abusivo
Assim, sob orientação profissional, o uso de medicamentos à base de Cannabis para tratar a síndrome de Tourette infantil surge como uma alternativa promissora e segura.
Como iniciar um tratamento seguro com medicamentos à base de Cannabis
No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autoriza a prescrição de medicamentos à base de Cannabis para diferentes condições de saúde. Então, para incluir canabinoides na sua rotina de cuidados, acesse a nossa plataforma de agendamento. Lá, você pode marcar uma consulta com médicos experientes nesse tipo de abordagem.
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