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Dor neuropática na Doença de Fabry: desafios e avanços no tratamento

Dor neuropática na Doença de Fabry: desafios e avanços no tratamento

Estudo clínico recente apresenta resultados importantes sobre o controle da dor neuropática em paciente com Doença de Fabry, um sintoma de difícil manejo com terapias convencionais

Publicado em

29 de abril de 2025

• Revisado por

Jornalista e pós-graduada em Filosofia e Literatura, com 13 anos de experiência em comunicação, conteúdo e estratégias digitais. Atuou como repórter, redatora, roteirista, ghost writer e head de conteúdo. Especialista em Thought Leadership e storytelling, acredita no poder das narrativas para conectar pessoas e ideias.

Um estudo clínico publicado recentemente relata a melhora significativa da dor neuropática em um paciente com Doença de Fabry após o uso de cannabis medicinal. O relato acompanha o caso de um homem de 32 anos que, após anos de sofrimento e falhas terapêuticas, encontrou alívio com o uso controlado de THC e CBD.​

Para contextualizar os impactos da doença e o potencial dessa abordagem, conversamos com a Dra. Rayana Maia, geneticista, professora de Medicina na Universidade Federal da Paraíba e diretora do departamento de relacionamento da Sociedade Brasileira de Genética Médica e Genômica. A médica reforça que a Doença de Fabry é uma condição genética progressiva, causada por uma deficiência enzimática que compromete múltiplos órgãos — e cujo controle da dor segue sendo um dos maiores desafios clínicos.​

Segundo ela, a Fabry é uma doença hereditária ligada ao cromossomo X, o que explica por que os homens, que só têm uma cópia do cromossomo, costumam ser mais afetados. “A deficiência enzimática leva ao acúmulo progressivo da substância GL-3 nos tecidos, causando lesões multissistêmicas. O diagnóstico pode ser feito por dosagem da enzima e confirmação genética, além de exames complementares para avaliar o comprometimento cardíaco, renal ou neurológico”, explica.

Doença de Fabry e a dor neuropática

Entre os sintomas mais incapacitantes da Doença de Fabry está a dor neuropática — sensação de queimação, pontadas ou formigamento, especialmente nas mãos e pés. Dra. Rayana observa que, além de comum, essa dor é um dos principais fatores que reduzem a qualidade de vida dos pacientes. “Ela pode ser contínua ou em crises intensas, geralmente desencadeadas por febre, estresse, exercício físico ou calor. É um sintoma clássico e debilitante, sobretudo na infância e adolescência.”

Mesmo com as terapias específicas para a doença, o alívio da dor ainda é limitado. As abordagens hoje disponíveis incluem a terapia de reposição enzimática (TRE) com agalsidase alfa ou beta e o uso da chaperona migalastate, uma medicação oral indicada para mutações específicas. No entanto, essas intervenções nem sempre surtem efeito sobre os nervos periféricos — justamente a origem da dor neuropática.

“A fisiopatologia da dor na Fabry é complexa: envolve desde o acúmulo lisossomal nos nervos periféricos até alterações vasculares e neuroinflamatórias. Mesmo os tratamentos que atuam na causa da doença têm dificuldade de alcançar os tecidos neurais, por causa da barreira hematoencefálica”, detalha a geneticista. “Isso explica por que o manejo da dor permanece um desafio.”

Na prática clínica, medicamentos como gabapentina, pregabalina, amitriptilina e duloxetina são tentados para o alívio da dor. “A resposta é muito individual. Em alguns casos, pode-se tentar opioides de baixa potência. Mas nem sempre há bons resultados.”

O estudo de caso: Cannabis como alternativa

Diante desse cenário, um estudo publicado por pesquisadores do Centro Regional de Coordenação de Doenças Raras de Udine, na Itália, apresenta o caso de um homem de 32 anos com Doença de Fabry clássica, cuja dor neuropática severa persistia há anos, mesmo após diversas tentativas terapêuticas — incluindo TRE e analgésicos convencionais.

A equipe então decidiu iniciar o uso de Cannabis medicinal com formulação balanceada de THC (8%) e CBD (12%), sob acompanhamento médico e com consentimento informado. Em apenas um mês, o paciente relatou uma melhora significativa na dor noturna, com impacto direto sobre a qualidade do sono. Essa melhora foi mantida durante mais de um ano de uso contínuo, sem efeitos colaterais relevantes.

Segundo os autores, embora a dor diurna e as crises agudas ainda estivessem presentes, houve uma clara redução da interferência da dor nas atividades diárias e um aumento na qualidade de vida geral do paciente.

Dra. Rayana considera o relato importante, embora ainda isolado. “Opções terapêuticas são sempre bem-vindas. Ainda que este seja apenas o primeiro caso documentado, o uso da Cannabis já é conhecido no controle da dor em outras condições. Dado o mecanismo da dor na Fabry e o potencial anti-inflamatório e neuromodulador do CBD, acredito que pode sim representar uma alternativa viável”, avalia.

Ela reforça que os canabinoides atuam no Sistema Endocanabinoide, que regula a dor em múltiplos níveis do sistema nervoso.

“O CBD tem efeitos anti-inflamatórios e neuromodulatórios que podem ajudar na modulação da dor crônica por meio do sistema endocanabinoide. Quando supervisionado, seu uso pode apresentar um perfil de segurança aceitável.”

Perspectivas para o futuro

O campo do tratamento da Doença de Fabry vive um momento de avanço. “Estamos na era da medicina de precisão. Já existem ensaios clínicos com terapia gênica, além de novas formulações de enzimas com melhor capacidade de penetração nos tecidos-alvo”, comenta a Dra. Rayana.

Mas ela ressalta que o cuidado com o paciente vai além das terapias-alvo. “A dor precisa ser tratada de forma personalizada. Uma equipe multidisciplinar, composta por geneticista, neurologista, psicólogo, fisioterapeuta e nutricionista, pode contribuir muito no acompanhamento global. Manter um diário da dor, por exemplo, ajuda a identificar gatilhos e ajustar o plano terapêutico com mais precisão”, finaliza. 

Para quem deseja conhecer mais detalhes sobre o caso descrito e os dados apresentados pelos pesquisadores italianos, o estudo completo está disponível em acesso aberto na revista Molecular Genetics and Metabolism Reports. Você pode ler o artigo neste link.

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