O médico Luiz Scocca se apaixonou pela psiquiatria ainda na graduação, mas, na década de 1990, a especialidade era diferente da praticada neste século.

“A gente fazia psiquiatria para ser terapeuta. A grande maioria não era para ser clínico. Havia muito pouco recurso para oferecer ao paciente.”

Enquanto isso, porém, algo no tratamento de usuários de drogas o chamava atenção. “Nós sempre acompanhamos, até com uma certa crítica, sobre como havia alguns pacientes que obtinham uma resposta para seus sofrimentos com a Cannabis, embora não fosse medicinal.”

“Isso sempre foi uma pulga atrás da orelha. A gente sabia que se tratava de uma dependência, de tudo que de ruim que a Cannabis pode trazer como droga ilícita, mas ao mesmo tempo também víamos resultados positivos em alguns pacientes e não tinha como negar evidências.”

Primeiras prescrições

Na virada do século, porém, a demanda por psiquiatras clínicos, que trabalham com a prescrição de medicamentos, já estava consolidada. A novidade para Scocca foi a demanda de uma associação de pacientes para que prescrevesse a Cannabis medicinal para crianças com epilepsia.

Foram suas primeiras prescrições de medicamento canabinoide para a condição que havia mais evidências científicas até o momento, graças ao trabalho do professor Elisaldo Carlini. No entanto, ainda hoje, mas principalmente naquela época, havia muita restrição e preconceito advindo dos conselhos de medicina e preferiu manter certa distância do tema.

Um cenário que só começou a mudar a partir de meados dos anos 2010. Com a flexibilização que permitiu a importação de medicamentos extraídos da Cannabis sativa, decidiu que chegara a hora de mergulhar de vez no assunto, estudar e prescrever para seus pacientes.

Cannabis na prática da psiquiatria

“A minha experiência com Cannabis tem sido muito positiva. O grande fator limitante é realmente o custo”, afirma o psiquiatra. “Ele traz resultados extremamente benéficos e, prescrevendo de maneira adequada, eu tenho resultados que eu não obtinha com medicamentos.”

“Em transtornos ansiosos, depressão, insônia e transtornos dolorosos, eu tinha respostas muito ruins e os pacientes responderam extremamente bem (à Cannabis) na medida que pude usar.”

Para Scocca, o principal benefício da Cannabis na psiquiatria é poder reduzir o uso de medicamentos alopáticos. “Com uma prescrição extremamente simples eu consigo obter resultados onde são necessários muitos medicamentos para obter e  com muitos efeitos colaterais.”

“Com a Cannabis, nas patologias para as quais eu prescrevo, consigo resultados com muito menos efeitos colaterais. Quando não podemos abandonar os medicamentos tradicionais, eu passo a obter respostas que já não estavam dando mais.”

“Um paciente que sempre se deu bem com um medicamento e com o tempo passa a não ter a mesma resposta, eu associo com CBD e ele passa a responder de novo bem. Em uma situação ideal, até deixa de tomar os medicamentos clássicos.”

O preconceito na psiquiatria

O psiquiatra acredita que o preconceito ainda é o principal entrave para que a Cannabis medicinal chegue a todos que precisam. “Eu não posso fechar os olhos as evidências que estão sendo demonstradas pelos trabalhos científicos. Ainda há uma grande celeuma e eu acho que isso atrapalha a ciência. Olha o preço que é praticado para obter um fitoterápico que deveria ser barato.”

“Não é a primeira medicação que eu ofereço, mas eu sempre fui aberto. Não que eu seja usuário de maconha, porque existe essa fantasia sobre os médicos prescritores. Tudo é baseado em pesquisas e evidências científicas”, finalizou.

“A Cannabis não é só um movimento social e cultural, mas um movimento científico sendo realizado em grandes centros de pesquisa.”

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